Ônibus lotado. Homens, mulheres, crianças, idosos, donas, donos, senhoras, senhores, estudantes, professores. Todos iguais, segurando pra não cair nas sinuosas pistas simples do estado da Bahia, aproveitando o ar condicionado enquanto o calor aumenta lá fora.
Pela estrada cacau, jequitibás, jacarandás, sapucaias, cobis, ipês...o rio Cachoeira, o bairro pobre, vendedores de jambo e de guaiamum na beira da estrada, vendedores de móveis de palha, menino dando estilingada em passarinho, o matadouro abandonado em ruínas, assentamentos rurais, conversas e mais conversas, falas e mais falas se entremeando.
De repente, ao som de ônibus lotado, aparece uma sanfona. Um senhor, um chapéu, uma sanfona e uns forrós para adocicar o caminho. O som de ônibus lotado deu lugar a um sanfoneiro sorridente que em meio ao caos matinal teve a ousadia de dizer: "parem e aproveitem a vida" ao tocar algumas notas em seu instrumento.
Alguns quilômetros depois: a Universidade.
O sanfoneiro se despede, com aplausos da platéia em pé. Uns entram na Universidade, o sanfoneiro e outros poucos seguem mais uns metros para a periferia vizinha. Na Universidade, o prédio da Torre da Administração e seus vidros espelhados, um arranhacéu em terra de ninguém, refletindo a desigualdade, mas refletindo também um
pouco da arte da vida.
Sara Mortara